Linha de frente: Não ter monotonia é a inspiração da técnica de enfermagem Orlandina
A técnica de enfermagem Orlandina Galhardo nasceu em São Luís, no Maranhão, onde finalizou o ensino médio. Incialmente, queria fazer um curso de auxiliar de laboratório, mas como não havia mais vagas, optou por fazer o curso técnico de enfermagem. Apesar disso, passou um bom tempo sem atuar na área.
Logo, ela se mudou para Salvador, na Bahia, onde tinha parentes e passou a trabalhar na área comercial, onde permaneceu por oito anos. Quando ficou sem emprego, foi para o Rio de Janeiro. Lá, ficou por um ano também trabalhando em loja. No entanto, sempre se questionava pelo fato de ter uma formação de técnica de enfermagem e não trabalhar na área.
Tudo mudou quando voltou para São Luís e conheceu uma colega que a convidou para Marabá, cidade que ela nunca tinha ouvido falar. Em Marabá conseguiu emprego em um hospital particular, onde trabalhou por quatro anos. Em 1996, fez o concurso público municipal e foi empossada como auxiliar de enfermagem.
“Fiz essa prova sem esperança nenhuma de passar. Fiz porque fui mais incentivada por um colega. Tanto é que quando fui aprovada nem acreditei, disse ‘não, nem estudei’ e vejo que tudo foi a mão de Deus”, relembra a profissional.
Inicialmente, sua lotação foi para o posto de saúde Maria Bico Doce, no núcleo São Félix, onde passou um ano trabalhando. Depois, transferida para o posto Pedro Cavalcante, trabalhou por dois anos. Então percebeu que o trabalho calmo de uma unidade básica de saúde ainda não era o que queria. Foi quando surgiu a oportunidade de ser transferida para o Hospital Municipal de Marabá (HMM).
“Eu estava no Pedro Cavalcante e ‘meu Deus isso aqui não é para mim’. Porque eu não sou técnica de enfermagem de ficar parada e naquela época o serviço do posto era mais tranquilo. Eu queria trabalhar em um lugar que eu mostrasse mais serviço”, ressalta.
No hospital, foram quase vinte anos de trabalho, onde atuou principalmente no pronto socorro. O movimento intenso no setor bem como os plantões, animaram Orlandina que aprendia mais a cada dia e desenvolveu habilidades na profissão que ainda não havia experimentado.
“Não era pelo dinheiro. Profissão, você trabalhar na tua profissão, se ama aquilo que você faz, não está nem aí para o salário. Você quer trabalhar, você quer estar ali cuidando de vidas. Eu amo a minha profissão, por isso ainda não me aposentei. Vou fazer 64 anos em setembro e às vezes fico pensando: Meu Deus como é que eu vou me aposentar, o que eu vou fazer? ’’, se pergunta.
Ela conta que sentiu na pele o preconceito por ser uma mulher negra e que presenciou situações em que, principalmente, os acompanhantes dos pacientes foram racistas.
“Eu nunca fui agredida fisicamente, mas racismo eu sofri. ‘Tu é negra’. Eu ficava fazendo ficha porque não tinha computador e era tudo à mão. Era uma fila enorme. Eu fazia milhões de fichas à mão. A mulher chegou para mim: “Cadê o doutor. Ele não está trabalhando hoje? Tu não sabe sua negra, não era pra tu estar aí, tu era para estar em uma cozinha”. E aquilo era um tapa na cara. Tinha que erguer a cabeça e continuar o trabalho”, lembra Orlandina. “Porque no momento que essas coisas acontecem contigo, a tua vontade é de pegar a bolsa e ir embora. Mas eu resisti. Nem hoje eu daria queixa. Se me agredir, não vou fazer isso porque tenho um Deus que é Deus de Justiça”.
Em 2018, percebeu que seu trabalho já estava feito no hospital e pediu transferência. Atualmente, trabalha na Unidade Básica de Saúde Enfermeira Zezinha, na Folha 23.
Na UBS, ela realiza curativos, acompanhamento de pacientes com hipertensão e diabetes, faz retirada de pontos, troca de sondas, teste do pezinho, aplica medicação e vacina, além de outras atividades.
Entre as histórias de vida e morte que marcaram sua jornada, ela conta que teve uma paciente diabética que passou por amputações. Orlandina explica que ficou consternada com a situação da paciente e se perguntando como deixaram a senhora chegar àquele estado. Ela veio a falecer.
Outra história que a marcou foi a cura de uma outra senhora que estava com cirrose. A paciente pediu para Orlandina fazer uma oração por ela e algum tempo depois, já curada, retornou ao hospital para agradecer o atendimento. A técnica sente que Deus agiu na restauração da saúde da paciente.
“Eu não me aposentei porque não gosto de ficar parada, amo minha profissão de técnica. Eu digo que se não fosse técnica de enfermagem, se não trabalhasse hoje nessa área, não sei o que eu seria. Não me vejo em outra profissão. Já ensinei muitos alunos, muitos técnicos”, pontua.
Ela compartilha que teve oportunidades de cursar faculdade mas que não quis por amar o que faz. Para a aposentadoria que já se aproxima, Orlandina planeja voltar a São Luís e se dedicar mais à igreja que faz parte.
Ao comentar sobre o que a motiva a se dedicar intensamente ao seu trabalho, diz: “Não é o dinheiro. Você tem que amar aquilo que faz. Se você não amar, se você é um pedreiro, um carpinteiro, um doutor, é advogado, mas se você não amar o que faz, não vai para frente, não vai passar 26 anos fazendo aquilo. Se eu não amasse essa profissão, estaria hoje completando 26 anos de técnica de enfermagem?”, finaliza Orlandina Galhardo.
Texto: Ronaldo Palheta
Fotos: Ronaldo Palheta e Paulo Sérgio