Saúde: Médico do CAPS orienta sobre como lidar com comportamento suicida
Setembro é o mês de prevenção ao suicídio, de valorização a vida. Dados do Ministério da Saúde estimam que mais 11 mil mortes por suicídio são registrados no Brasil por ano, o que dá em média um suicídio a cada 46 minutos. No mundo o número de pessoas que acabam com a própria vida chega aos 800 mil, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS).
Neste mês a Prefeitura de Marabá está organizando diversos eventos. No dia 12 de setembro teve palestras e exposições com vários profissionais, entre eles os psicólogos e psiquiatras do Centro de Atenção Psicossocial de Marabá (CAPS) e do Centro de Especialidades Integradas (CEI). Dia 18 de setembro, as 8 horas, o CAPS e o CTA farão uma panfletagem na ponte sobre o Rio Itacaiunas, próximo ao semáforo. No dia 27 de setembro haverá ainda um encontro com profissionais da rede pública com o objetivo de discutir as principais mudanças que levam ao aumento de suicídio entre jovens e adolescentes.
Para ajudar na identificação de possíveis sinais suicidas, evitar que mais vidas sejam perdidas e entender um pouco mais sobre o assunto, entrevistamos o médico especialista em saúde mental do Centro de Atenção Psicossocial de Marabá (CAPS) Charles Roosevelt de Almeida Vasconcelos.
Do que se trata o Setembro Amarelo?
O Setembro Amarelo foi estabelecido por causa do dia 10, Dia Internacional de Prevenção ao suicídio. O Brasil aderiu o mês para tratar especificamente dessa questão. Vejo como uma forma de promoção à saúde mental. É um setembro pela vida. Para falarmos sobre os problemas que acontecem com a gente, pois já é demonstrado que os principais casos de suicídio são entre pessoas que não falam sobre isso, que colocam as emoções dentro de si nos porões da alma. Resumindo o Setembro Amarelo é um programa de promoção a saúde mental.
Quais fatores que levam a pessoa ao suicídio?
Seria leviano dizer que descobrimos o que leva uma pessoa ao suicídio. Temos pistas, muitas pistas. O suicídio aparenta vir de vários fatores. Não existe o suicídio, são os suicídios. A gente, às vezes simplifica o sentimento de alguém. O suicídio de Getúlio Vargas não é o mesmo suicídio da Amy Winehouse ou da Dona Sandra. Ele pode ocorrer por raiva, para atacar os outros, pode ser tristeza, dor. Também pode ser diminuição de mundo, quando uma pessoa não conversa com outros e toma uma proporção irreal de ideias na cabeça. O suicídio acaba sendo uma força de afeto, emoções e sentimentos não expressados, que acabam levando as vias de fato.
Há algum padrão?
Foi percebido que teve um crescimento e a maioria entre jovens, também se observa isso entre homens. Uma das percepções que temos é que como homens não falam muito, acabam tendo mais dificuldade em expressar e elaborar seus sentimentos, por isso acabam se matando mais. Isso vai por muitos caminhos. A falta de fala, a dor existencial, o cansaço, o fracasso e a dificuldade de inteligência emocional.
E como isso pode ser trabalhado?
Países diminuem sua taxa de suicídio ensinando inteligência emocional na escola. Falta de coletividade, isolamento social, todas essas coisas contribuem, são pistas do suicídio. Nunca teremos uma certeza porque cada pessoa é um universo. Viúvos, solteiros e divorciados se matam mais dos que os que têm família e são casados. É uma pista. Se uma pessoa está com muita raiva, está triste, cansado, já tentou suicídio, está sozinha no mundo, não consegue conversar direito, a gente já liga o alerta de possibilidade eminente do suicídio.
Como familiares e amigos podem identificar alguém que pensa em cometer suicídio?
Primeiro, normalmente o suicida, fala. Essa história de que o suicida não fala não tem embasamento. O suicida fala, ele quer expressar. Essa é uma das características, tanto que escrevem cartas. A morte não é uma coisa que tem que ser em vão. Eles contam, mencionam, conversam. Os homens normalmente jogam uma piada. Geralmente existe essa comunicação, basta ter atenção. Outras percepções são isolamento social não saudável. Espécie de isolamento patológico, que também pode ser percebido pelas famílias. Quando chega nesse momento de isolamento patológico, demonstra tristeza.
E como reagir?
Quando acontece isso a primeira coisa a fazer é acolher. Exercício de força e autoridade normalmente têm efeito contrário. “Não se mate”, “a vida é bonita”, “não está vendo a vida que você tem aqui”. Normalmente essas frases aumentam a tristeza, já que eles pensam: “Se eu estou vivendo uma vida tão boa porque então estou tão triste”. Isso adiciona culpa. Ouvir, já é dizer muito. Ouvir sem julgamento, sem aconselhamento excessivo, só ouvir já é uma forma muito boa da família ajudar. Também é importante levar até um profissional. Convidá-lo: “vamos juntos nos cuidar”. Levar até o Caps, até a UBS mais próxima que tenha psicólogo, para que os profissionais comecem a iniciar o processo de análise. Avaliar se é um suicida leve, moderado, grave, assim tomando as devidas precauções. Com tempo e análise, geralmente as pessoas saem desse quadro de suicídio.
Fale um pouco sobre o trabalho do CAPS
Aqui trabalhamos com muitos públicos, desde crianças suicidas, de 12 anos que tentam se matar, até idosos. A gente tem que ter um leque muito grande de artifícios. Isso é o trato, a dança, a coletividade, grupos, estabelecimento de atividades em que a pessoa possa expressar e organizar os pensamentos e comparar com outras bases, diminuindo um pouco a sensação de solidão no mundo. Agimos principalmente pela linha dos afetos, produzindo bons afetos. O suicídio, muitas vezes, acaba sendo uma confusão entre o interior e o exterior. Também usamos medicação para diminuir o grau de depressão em casos de depressão graves, quando não conseguem nem se levantar. É um modo de facilitar a ida dessas pessoas para esse campo de afetos e para trabalhar melhor com os outros.
Para finalizar…
Queria pontuar a questão da importância das pessoas no trato com suicídio que deve ser delicado, devemos tomar muito cuidado e isso vale para todo mundo. Devemos ter cuidado ao falar do suicídio. Tentar falar mais sobre a vida e de como é a vida dos que ficam, após um suicídio. Além disso faço um apelo as ações culturais, a cultura, segundo Nise da Silveira, foi o elemento utilizado pela sociedade desde muito tempo para organizar grandes coletividades. Então o teatro, a expressão, a música, a literatura, as conversas em praça pública, a organização de grupos de estimulação, tudo isso são verdadeiros elementos em que a cidade pode ajudar as pessoas. As cidades geralmente são ambientes muitos hostis. A cultura é a forma real, efetiva, que nós usamos para compreender a melhor forma de se tratar essa coletividade. O suicídio não é um caso individual, é um caso de coletividade de comunidade, então não só a medicina ou psicologia, mas principalmente a arte que vai ajudar a gente a elaborar o consciente coletivo.
Texto: Osvaldo Henriques
Foto: Paulo Sérgio dos Santos