Comunicação: Fake news prejudica cidadania e reduz qualidade da informação
Escolas da rede pública municipal já realizam projetos a fim de combater as fakes news
Composta por jovens que cresceram usando a internet, integrantes da geração Z, conhecida também como geração digital, e até mesmo os mais maduros que utilizam as ferramentas tecnológicas, estão embebedados por informações falsas na palma da mão. Um simples toque em um hiperlink é capaz de fazer estragos e até mesmo destruir vidas. Especialista na área alerta que as fakes news, as famigeradas notícias falsas, podem ameaçar até mesmo a democracia e cidadania.
Doutora em Comunicação Social e professora do Curso de Jornalismo da Unifesspa (Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará) no campus de Rondon do Pará, Janine Bargas, lembrou que fake news é um nome novo para uma prática antiga, pois desde muito tempo, informações não verdadeiras sempre circularam na nossa sociedade. Todavia, o que tem de diferente na atualidade e faz com que esse fenômeno ganhe uma proporção maior, é o fluxo de informações intensas que a geração digital tem acesso.
Antes do boom das mídias digitais, nos meios de comunicação tradicionais, o acesso às informações levava mais tempo, as pessoas necessitavam esperar a publicação no jornal impresso ou revista, ser apurado pelo rádio e TV ou até mesmo o período de elaboração de um site. “Agora tudo isso está na palma da nossa mão, por meio dos smartphones. Atualmente existem mais smartphones do que habitantes no País [mais de 200 milhões de celulares ativos]. Boa parte do acesso à informação é feito por esse aparelho que checamos em todos os lugares”, explicou a doutora, atribuindo o termo ubiquidade, ao acesso a qualquer momento da informação.
Nesse sentido, a professora chama a atenção para o fator da mobilidade, já que as informações podem ser acessadas em qualquer lugar, no ônibus, no trabalho, em uma simples caminhada na praça, entre outros locais. Trata-se de um fenômeno da contemporaneidade. Com isso, o fluxo faz com que as informações circulem muito mais rápido, tornando a internet uma grande fonte de notícias, dos mais variados temas, que podem ser acessadas pelos telefones celulares, tabletes e notebooks.
ROBÔS
Mais um agravante que contribui para disseminação das fake news é o fato de que elas não contam apenas com mãos humanas, os robôs, também conhecidos como perfis automatizados nas redes sociais, também têm uma parcela de culpa no crescimento desse fenômeno. Para se ter uma ideia, um estudo inédito da Diretoria de Análise de Políticas Públicas da Fundação Getúlio Vargas (FGV/DAPP) constatou que nas eleições presidenciais de 2014, os robôs chegaram a gerar mais de 10% interações no twitter.
“Nós somos induzidos pela facilidade da informação que chega, não buscamos nos aprofundar nela. Ela chega como link, de forma mais rápida. A gente não clica na notícia para ler, não temos a confiabilidade das fontes, de onde surgiu aquela informação. O ser humano se apodera das frases de efeito e imagens. No final das contas, a gente compartilha”, descreveu a doutora, informando o porquê caímos com tanta facilidade nas fake news.
A especialista em Comunicação Social afirmou que as falsas notícias afetam até mesmo a democracia e a cidadania, uma vez que, quando não há informações de qualidade, tomamos decisões errôneas. “As informações que estão sendo veiculadas nas bolhas sociais, como Facebook e Instagram, não estão sendo de interesse público. Quem as produz, na maioria das vezes, possui interesse meramente econômico”, ponderou Janine Bargas.
Existe outro público que se aproveita das notícias falsas para ganhar dinheiro, como por exemplo, consumir produtos, promoção de empresas, entre outros. “As fake news possuem relação direta com poder econômico, porque os países que a replicam não tem marco regulador, não tem responsabilização criminal”, destacou ela.
Janine Bargas frisou que a verdade parece não mais existir, devido a banalização dela. As pessoas não têm responsabilidade em verificar se a notícia é verdadeira ou falsa. “Devemos começar a nos perguntar quais as consequências de compartilhar uma fake news e, como cidadão, verificar”, finalizou a doutora em Comunicação.
VÍTIMA DE FAKE NEWS
Você já leu alguma notícia falsa? A resposta provavelmente será sim, mas o problema maior está em cair em uma fake news. A estudante Beatriz Eduarda Santos Barbosa, de 14 anos, moradora do Km 7, já passou por uma situação vexatória por conta dessas mentiras, que embora replicadas muitas vezes, continuam sendo inverdades. Ela foi com sua família para uma rede de supermercados de Marabá, em busca de emprego para menor aprendiz. A notícia falsa com a promessa de um bom salário ao adolescente foi repassada em uma dessas bolhas sociais.
“De cara já chegamos no supermercado e lá escutamos a notícia na voz (sistema de som do local) que o supermercado não estava empregando menores de idade, e era uma notícia falsa da internet. Várias pessoas já tinham procurado o mesmo local e dado os documentos pessoais para registrar na possível vaga de emprego, que prometia mais de 1.000 reais de salário. Tudo não passava de fake news. Voltei para minha casa com sensação que fui enganada”, lamenta ela.
PROJETO
Escolas da rede pública municipal já realizaram projetos a fim de combater as fakes news. Na “Pedro Peres”, localizada em Morada Nova, a professora de Língua Portuguesa Catiane da Silva Abreu trouxe para a sala de aula o conteúdo dos novos gêneros digitais, que contempla o tema.
Ela trabalhou com os alunos a reportagem do falso fotógrafo da ONU, exemplificando o conceito de fake News, depois construiu plaquinhas com os dizeres, “curtir, compartilhar, não curtir, fake e sensacionalismo”, para que os alunos saibam diferenciar as propostas editoriais de cada notícia, além de separá-las entre verdadeiras e falsas. Esta atividade foi nomeada “Fato ou Fake”.
“Os alunos conheceram melhor os riscos de compartilhar informações falsas. Conseguiram distinguir as notícias sensacionalistas e houve uma discussão muito rica sobre os riscos”, enfatizou Catiane, professora efetiva da rede municipal.
CRIMINALIZAÇÃO
Muito cuidado diante de uma informação com fonte duvidosa. Apesar de não existir uma legislação específica, há formas de punição para quem produz e divulga fake news, podendo ser responsabilizado legalmente com pagamento de indenização por danos morais e até processado por crimes contra a honra, além de ser solicitado pela justiça para a retirada do conteúdo do ar por meio de autorização judicial. No Congresso Nacional há pelo menos três projetos de lei, e um no Senado Federal, que criminalizam a divulgação de fake news com previsão de multas e detenção.